De repente eu simplesmente pisquei os olhos e acordei. Com a
pior das lembranças. (Mas eu nem estava dormindo).
Acordei com a lembrança de tudo que eu tinha esquecido.
Cinco anos inteiros!
Mas da mesma forma que eu não estivera dormindo, eu também
não tinha esquecido. Eu estava acordado e lembrava perfeitamente de tudo.
Até o momento que eu acordei de estar de estar acordado e
lembrei de tudo que minha lembrança me tinha feito esquecer.
Meu primeiro esquecimento tinha sido o de perdoar.
Eu não me perdoei por te querer tão errada, não te perdoei
por não ter me aceito. Não me perdoei por ter insistido e não te perdoei por
ter se rendido. Não te perdoei por me propor mudanças, não me perdoei por ter
me divertido tentando. Não te perdoei por ter tentado, não me perdoei por ter
conseguido. E neguei.
Meu segundo esquecimento foi negar.
Eu neguei que não te
quis e que te queria. Eu neguei que tínhamos tudo pra dar errado e depois
neguei que fracassamos. Eu neguei que valia a pena tentar de novo e de novo e
de novo. E até agora, quando eu finalmente me lembro, eu acho que continuo
negando.
Eu neguei que você estava do meu lado (mas agora que você
não está mesmo!).
Eu neguei que estava
errado (mas te neguei o direito de estar errada).
E neguei que você
estava certa. Ainda agora, quando eu acho que já lembro de tudo, não posso
deixar de te negar isso. Eu conheço todas as suas certezas, e eu lembro de
todas elas.
E meu terceiro esquecimento foi lembrar.
Eu simplesmente me lembrava de absolutamente tudo!
Eu me lembrava de como você havia me ferido e de como seria
injusto que esquecer disso. Eu me lembrava de como eu havia te ferido e de como
esses ferimentos eram uma justa retribuição aos que você tinha me causado. Eu
me lembrava de como eu queria estar ao seu lado e de como era tão difícil estar
com você.
Eu me lembrava de tudo que havia te prometido ser e então me
lembrava de como o seu cinismo me eximia da difícil tarefa de tentar cumprir
minhas promessas.
E meu último esquecimento foi a dor.
A dor de perceber que eu não era quem eu te prometi que
seria. A dor de perceber que você nunca foi a pessoa que eu achei que você
poderia ser. A dor de perceber que eu tentei. A dor de perceber que você
tentou. A dor de perceber que nenhum dos dois percebeu as tentativas do outro.
E esse último esquecimento se trancou num cofre com todos os
outros. Num cofre de alívio onde os acontecimentos passaram a existir apenas
numa memória flexível de datas, cheiros, sorrisos, lágrimas... mas as lembranças permaneciam completamente protegidas no esquecimento de seus significados.
Até o momento que eu acordei e lembrei.
Mas que droga! Agora estou percebendo que naquele momento,
alguns instantes atrás, eu estava apenas começando a lembrar. Eu não tinha
lembrando de tudo.
Foi esse texto, cuja intenção inicial era de me aliviar, que
completou a tarefa das lembranças!
Ou será que completou mesmo?
Afinal, é tão mais fácil chamar essa reflexão de um novo
estágio do esquecimento e tentar ir dormir em paz...